Nove em cada dez mortes por suicídio no Brasil poderiam ser evitadas. Como? Informando, alertando, cuidando e prestando atenção em quem nos pede ajuda. Tirar a própria vida é um ato por vezes impulsivo, em um momento de crise, e que jamais deveria ser cogitado. Prevenir o suicídio é, além de perceber o outro, estar consciente de si verdadeiramente.
A prevenção contra o suicídio tem um forte aliado: o amparo, que pode ser familiar, de amigos ou até mesmo de projetos, causas e sonhos.
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A capacidade de amar e ver sentido nas coisas serve de força em diversos quadros. Para Lucinaura Diógenes, é fonte de esperanças. Após a partida da filha Bia Dote em 2008, na época com 13 anos, a geóloga e psicóloga em formação criou o Instituto Bia Dote (IBD) em 2013, como forma de ressignificar a dor da família.
“Quando Bia faleceu, foi um surpresa enorme. Ela não apresentava sinais, não identificamos nenhuma forma de transtorno, situação ou fatores de risco que pudesse levá-la a não querer mais viver. Nunca havíamos passado por uma situação de luto tão próxima. Ficamos perdidos procurando respostas, sem entender também a reação das pessoas. Esperavam que fossemos esconder, como se fosse uma morte não autorizada, um pecado, um segredo. Nos julgavam e nos cobravam. Eu não achava justo com Bia fazer isso, então nunca aceitamos”, desabafa Lucinaura.
Instituto Bia Dote: movidos pelo amor
A partir dos sentimentos vividos com a partida de Bia, Lucinaura movimentou familiares e amigos para fundar o IBD. Tudo começou com a participação dela, do marido Tadeu Dote e da filha mais velha Alice Dote em palestras e grupos de famílias que lidavam com o luto. “Ainda em 2009 e 2010, procuramos por quem falasse sobre o tema, e havia pouquíssima coisa. Nem campanha Setembro Amarelo existia. Tivemos a ideia de preparar nós mesmos palestras motivacionais, sobre promoção da vida, e então pensei que poderíamos pegar esse trabalho e, de fato profissionalizar. Criar uma instituição, com obrigação constante. Honestamente, nunca havia pensando em sair da minha área (geologia) para trabalhar com outra coisa, mas aqui estou”, conta Lucinaura.
Prevenir o suicídio é promover a vida
A intenção de ajudar a fazer o tema do suicídio, ainda um tabu, emergir como discussão necessária à sociedade é o lema do IBD. Hoje, o instituto serve como um espaço para atendimento psicológico, acolhimento, ajuda e partilha de histórias, além de contribuir na mudança da realidade ainda delicada sobre a abordagem do tema suicídio.
O Instituto Bia Dote conta com 13 psicólogos, atendendo gratuitamente mais de 100 horários por semana, tudo de forma gratuita e simplificada. “Quando começamos a oferecer o atendimento, prezamos por tornar o IBD um espaço de escuta e sem julgamentos. Então, quem quiser, pode ligar para a gente e marcar um horário de acordo com sua disponibilidade e a dos nossos profissionais, sem ser necessário encaminhamento médico. Tomamos essa decisão justamente para facilitar a busca por ajuda, pois percebemos que era um fator que dificultava a procura”, explica Lucinaura.
Para a psicóloga Débora Nobre, que atua no Instituto desde 2017, prevenir o suicídio é promover a vida. “A forma de viver a dor para cada pessoa é diferente. Existem níveis de sofrimento. A maioria de nós, quando saudáveis, conseguimos lidar com a dor. Uma cervejinha no fim de semana e está tudo bem. Outras pessoas não encontram saída, querem se matar e precisam de ajuda. Aqui atuo com a terapia pela fala, combinadas à técnica de respiração, planejamento de comportamento; com foco no encontro de algo, do sentido. A depender do caso, vamos escolhendo os recursos que serão utilizados para ajudar”, afirma a psicóloga.
Além do atendimento, o IBD oferece outros diversos serviços e projetos que auxiliam na prevenção do suicídio e na promoção da vida. Entre eles estão o Grupo de Apoio às Famílias Sobreviventes do Suicídio, o Instituto Bia Dote nas Escolas, Abraço de Bia e a escuta terapêutica Terapia na Cidade.
Confira todos os serviços da instituição no site: https://institutobiadote.org.br/
Dados alarmantes
A Organização Mundial de Saúde (OMS) aponta o suicídio como a segunda principal causa de morte entre jovens com idade entre 15 e 29 anos. O período é marcado pelo paradoxo de ser jovem demais e ter o peso das primeiras grandes decisões. Qual profissão escolher, qual carreira seguir, tempo limite para conquistar a independência financeira. Nesse momento tão conturbado de nossas vidas, podem surgir diversos questionamentos, desde “para onde ir?” até “qual o sentido da vida?”.
Este ano, o Centro de Valorização da Vida (CVV), em parceria com o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), promoveu uma série de vídeos para falar sobre suicídio e cuidados com a saúde mental, com foco em crianças e adolescentes. O intuito é abordar temas que podem ser fator desencadeante de comportamentos suicidas, além de quebrar barreiras e falar abertamente sobre o assunto, de forma cuidadosa e informativa. O material está disponível gratuitamente no canal do CVV no Youtube.
Série CVV/Unicef:
Além dos jovens, o CVV também promoveu vídeos para falar sobre prevenção do suicídio com pais e educadores. A entidade disponibiliza esses e outros materiais sobre o assunto no site oficial. Confira: https://www.cvv.org.br/conheca-mais/.
Sinais de alerta
Situações de enfrentamento de conflitos, desastres, violência, abusos ou perdas e um senso de isolamento estão fortemente associados com o comportamento suicida, aponta a OMS.
“Pensar sobre a morte, até certo ponto, é natural ao ser humano. É até saudável pensarmos sobre essa questão da vida. No entanto, o alerta é quando a morte aparece como uma solução para os problemas do indivíduo. Geralmente, esse sentimento está relacionado à perda de uma ‘âncora’, ou a um fracasso”, explica a psicóloga Rebeca Morais.
As taxas de suicídio também são elevadas em grupos vulneráveis que sofrem discriminação, como refugiados e migrantes; indígenas; lésbicas, gays, bissexuais, transgêneros e intersexuais (LGBTI); e pessoas privadas de liberdade. Ainda de acordo com a OMS, o fator de risco mais relevante para o suicídio é a tentativa anterior.
Segundo Rebeca, o principal sinal que deve alertar sobre um comportamento suicida é o negativismo sobre a vida. “Em geral, pessoas que têm uma ideação suicida ou já tentaram, têm uma visão muito negativa, constante, sobre o mundo. É muito insatisfeita e triste com o trabalho, com os relacionamentos e consigo, não consegue ver sentido nas coisas que faz, se isola e está sempre pra baixo. Nem sempre ela vai falar claramente que quer morrer, mas pode dar indícios de que está perdida, sentindo-se sem saída”, elenca a psicóloga.
Setembro Amarelo
A campanha mundial de prevenção e combate ao suicídio, intitulada Setembro Amarelo, propõe diversas ações que estimulam a conscientização acerca do assunto e simbolizam a valorização da vida. No Brasil, o movimento ganhou vida em 2015 a partir de um projeto entre Centro de Valorização da Vida (CVV), Conselho Federal de Medicina (CFM) e da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), em decorrência do Dia Mundial da Prevenção do Suicídio, marcado no dia 10 de setembro.
O objetivo do Setembro Amarelo é reforçar a importância de discutir e prevenir o suicídio enquanto um problema de saúde pública. Dados da OMS apontam que 800 mil pessoas tiram a própria vida por ano em todo o mundo. O Brasil aparece como o oitavo colocado no ranking da OMS, com 31.507 casos de suicídio registrados entre 2012 e 2014, com uma média de 32 casos por dia.
Como ajudar
“Sozinho a pessoa não consegue sair da situação. O primeiro passo precisa ser aceitar, entender, e buscar ajuda. O psicoterapia entra e ajuda a buscar estratégias para sair desses pensamentos alterados. Os profissionais dão assistência no momento que estão em consulta. No entanto, os familiares e amigos próximos também têm papel essencial nesse momento”, confirma a psicóloga Rebeca.
Um simples gesto de cuidado faz a diferença. Escute, abrace e esteja sempre atento aos sinais de quem pode estar em uma situação difícil. Também é importante incentivar a busca por ajuda profissional em todos os casos.
As orientações do Ministério da Saúde são:
- Encontre um momento apropriado e um lugar calmo para falar sobre suicídio com essa pessoa. Deixe-a saber que você está lá para ouvir, ouça-a com a mente aberta e ofereça seu apoio.
- Incentive a pessoa a procurar ajuda de profissionais de serviços de saúde, de saúde mental, de emergência ou apoio em algum serviço público. Ofereça-se para acompanhá-la a um atendimento.
- Se você acha que essa pessoa está em perigo imediato, não a deixe sozinha. Procure ajuda de profissionais de serviços de saúde, de emergência e entre em contato com alguém de confiança, indicado pela própria pessoa
- Se a pessoa com quem você está preocupado(a) vive com você, assegure-se de que ele(a) não tenha acesso a meios para provocar a própria morte (por exemplo, pesticidas, armas de fogo ou medicamentos) em casa.
- Fique em contato para acompanhar como a pessoa está passando e o que está fazendo.
Onde buscar ajuda
O CVV realiza um trabalho de apoio emocional, atendendo de forma voluntária e totalmente gratuita as pessoas que querem e precisam conversar, sob total sigilo. A principal via de é contato é o telefone, no número 188, além de email e chat 24 horas todos os dias pelo site: https://www.cvv.org.br/.
Em Fortaleza, diversas instituições promovem a escuta terapêutica, o atendimento psicológico gratuito ou a preço popular. Confira:
CAPS e Unidades Básicas de Saúde (Saúde da família, Postos e Centros de Saúde).
UPA 24H, SAMU 192, Proto Socorro; Hospitais
Centro de Valorização da Vida – 188 (ligação gratuita)
CENTRO DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL (CAPS)
Endereço: R. Pinto Madeira, 1550 – Aldeota
Telefone: (85) 3105-2632
Instituto Bia Dote
Endereço: Torre Quixadá – Av. Barão de Studart, 2360 – sala 1106 – Aldeota
Telefone: (85) 3264-2992
Clínica Escola de Psicologia da UFC
Endereço: Rua Waldery Uchôa, 3, no bairro Benfica
Telefone: (85) 3366-7690
Clínica Escola de Psicologia da Unifor – Nami
Endereço: Av. Dr. Valmir Ponte
Telefone: 3477-3611
Clínica Escola Maurício de Nassau
Telefone: 3101-7720
Clínica Escola Fanor
Endereço: Av. Santos Dumont, 7800
Telefone: 3052-4865
Clínica Escola de Psicologia do Centro Universitário Estácio do Ceará
Telefone 3271-1992
Clínica Escola da Uece
Endereço : Av. Dr. Silas Munguba, 1700 – Campus Itapery
Telefone: 3101-9981
Clínica Arcádia
Endereço: Rua Martinho Rodrigues, 191, bairro de Fátima
Telefone: 30345508
Instituto Raízes
Endereço: Rua Adolfo Moreira de carvalho, 86, Edson Queiroz.
Telefone: 34592477
Instituto Sherpa
Endereços: Av. Viena Weyne, 1167 – Lago Jacarey; Av. Antônio Sales, 1885, sala 203, Joaquim Távora.
Telefone: 3271-0564
ATENÇÃO: Sinais como mudanças repentinas de humor, frases inesperadas de alerta pedindo socorro ou comportamentos depressivos podem indicar a necessidade de ajuda. Ao apresentar qualquer um desses sintomas ou sentimentos relacionados, o indicado é procurar ajuda profissional com urgência.